sábado, 7 de março de 2009

PIPOCA OU NÃO PIPOCA?

Foram oito anos de luta árdua até que, enfim, a mediocridade venceu: o projeto cultural/carnavalesco “Vai Pipocar o Frevo” não aconteceu em Macau neste ano. Com ele se perde uma parte da esperança de se manter viva a lembrança do verdadeiro carnaval macauense, reduzido atualmente a uma micareta fora de época (realizada na época do Carnaval) de quinta categoria. Restou ao macauense, pelo menos ainda este ano, o “Cordão da Fantasia”, criado em 2008, com o objetivo de reviver os antigos carnavais de blocos.

O Frevo e a Política

O “Vai Pipocar o Frevo” nasceu em 2002, resultado da obstinação do músico Leão Neto em não deixar morrer a tradição carnavalesca macauense. Em seu início, teve cunho totalmente independente, tendo a Prefeitura Municipal entrado apenas com a cessão da Praça da Conceição e o palco para a apresentação de Leão e sua Banda Mestre Avelino. Com a boa repercussão do projeto e críticas ao não patrocínio vindas dos mais diversos setores, o prefeito da época, José Antônio Menezes decidiu incorporar o projeto ao programa carnavalesco do Município, a partir do ano seguinte.
Em 2004 começam os problemas. Ano político, e tendo como um dos seus principais opositores o ex-vereador Chico Paraíba, o “Vai Pipocar o Frevo” é bombardeado com acusações de ser o “Carnaval da Oposição”. Dono do Jardim, um dos dois únicos blocos sobreviventes de um Carnaval que teve mais de vinte agremiações desfilando na década de 80, Paraíba é apontado como um dos mentores da “Micaretização” que tomou conta da folia macauense. Ao lado do Equipicão, presidido por Mário Lopes, cunhado do então prefeito Menezes, o Jardim é patrocinado pelo Poder Municipal, que lhes banca trio elétrico e bandas, sob a condição de que estes “emprestem” tais bandas para tocarem no Corredor da Folia da cidade. Nessas ‘condições’, não havia como os outros blocos sobreviverem.
A contragosto (preferia sua concunhada Odete Lopes, esposa de Mário), Menezes elege seu vice, Flávio Veras. Ao assumir em 2005, Veras cria uma Secretaria de Cultura e a entrega ao produtor cultural João Eudes Gomes. Em março, Macau realiza sua Primeira Conferência de Cultura, marco histórico potiguar, ignorado pelos nobres edis macauenses. Novos tempos? Nem tanto... Veras é cassado por crime eleitoral. Eudes faz questão de assinar ele próprio os contratos com as atrações contratadas pela Cultura, visando evitar possíveis superfaturamentos. É exonerado pelo prefeito em exercício José Severiano, em maio. A Justiça reconduz Flávio ao mandato. A Secretaria de Cultura é transformada numa Fundação. Quem é nomeado para dirigi-la? Chico Paraíba. O “Vai Pipocar o Frevo” parece ter selado aí o seu destino. Resiste bravamente até 2008. Em 2009, sob a alegação de que Leão teria pedido R$ 100 mil para realizar o Projeto, o prefeito Veras decretou a sua inviabilidade.


Pipocar na “fritura”

Na verdade, para 2009, o projeto estava orçado em R$ 42 mil, inclusos aí os músicos da Banda Mestre Avelino e a iluminação. Fora desse valor, ficaria a contratação de um equipamento de som e do palco, a critério da Prefeitura. Em 2008 já havia acontecido assim, tendo, talvez já no processo de fritura do Projeto, sido contratado um som de péssima qualidade. No valor pedido por Leão estavam incluídos ainda dois shows com artistas potiguares, como Crystal, que recentemente lançou CD e fez excursão pelo País, se apresentando em Brasília, entre outras cidades. Cai aí por terra a outra alegação espalhada pela organização do carnaval: Leão é acusado monopolizar um espaço público para apresentar o seu Projeto. Dentro dessa ‘teoria’ cabe um pequeno reavivamento na memória salineira: com a criação do corredor da folia, com seus camarotes elitistas, para apresentações de falsificações cearenses de bandas baianas de axé (prova real de que o cearense tem tendência a ser humorista), a heróica Praça da Conceição estava entregue às moscas nas noites de carnaval. Nenhum outro artista ou autoridade se propusera, até então, a movimentá-la à noite. Leão se arriscou. E deu certo! Trouxe de volta antigos foliões – condenados ao exílio – e deu emprego a vários músicos macauenses – escanteados – pelas novas (e caras) atrações musicais. Resgatou um pouco da nossa história carnavalesca, homenageando ícones do passado, como Zezinho do Bandolim, ‘dona’ Colô, Lila da Imperadores, Inácio dos Índios, além dos Blocos Sabiá e da Vitória. Falando em memória, Leão já integrou e compôs músicas para os dois grandes blocos existentes. “O Mascarado”, feita para o Jardim, foi, durante muito tempo, um segundo hino do bloco. A banda cearense que toca hoje lá sabe disso? Aliás, ela toca o ‘hino oficial’ “Somos todos do Jardim da Infância...” ? Muito difícil. Não é para qualquer um. Isso seria coisa para um guitarrista como Madruga e seu irmão baterista Chico de Hermes, referências jardineiras da década de 80, hoje personas non gratas ao bloco.

Teoria da locupletação

Antigos foliões compartilham a mesma tese: a transformação dos blocos Jardim e Equipicão em empresas financiadas por verbas municipais foi muito conveniente para seus dirigentes. Devido ao fato de serem sempre as mesmas bandas contratadas – algumas mudam o nome, mas os componentes são os mesmos –, se perguntam: Teria alguma coisa a ver com aquelas advertências que constam na Cartilha da AMARRIBO1? Por fim, concluem: se essa onda de revitalização do carnaval antigo pega, tira o folião dos grandes blocos, ressuscita os extintos, volta aquela coisa da identificação, do amor pela agremiação (Fulano do Balancê, Sicrano dos Bruxos), da competição sadia. Poderia ser o fim do atual modelo de carnaval. Então, melhor cortar o mal pela raiz. Falando em competição sadia, pergunto: Alguém ‘ganha’ o carnaval hoje? Antigamente jardineiros quebravam troféus e alegorias quando não eram campeões. Hoje é tudo muito tranqüilo, em ritmo de axé cearense. Mas, talvez, alguns ainda ganhem alguma coisa ...

Triste Finalle ... ou não!

Macau vai, a toque de caixa (!) – não em ritmo de frevo –, perdendo sua identidade cultural. Já não conta mais com o Teatro Municipal, inaugurado em 2003 pelo prefeito José Menezes. Com falhas na construção, seu telhado desabou em 2006, na gestão Flávio Veras, que não se preocupou em impedir que isso acontecesse e muito menos em reconstruí-lo. Cerca de R$ 1 milhão em verbas municipais e federais jogados, literalmente, ao vento. O baile Preto & Branco, organizado pelo Jardim há mais de 30 anos, foi retirado do programa carnavalesco por Veras. O presidente Chico Paraíba, funcionário da Prefeitura, não esboçou a mínima reação para sua manutenção. Tudo bem que há muito tempo não vinha uma atração de vergonha para animá-lo, mas era uma tradição! Mais uma que vai pelo ralo.
Resta ainda, como falamos no início, o Cordão da Fantasia, idealizado pelo advogado Renan Araújo, antigo presidente do extinto “Bruxos”. Conta com o apoio de pessoas ligadas à Prefeitura. Está em seu segundo ano. Esperemos que não desperte a ira dos ‘Micaretizadores’...

Quanto a Leão e a Banda Mestre Avelino, foram contratados pela Fundação Capitania das Artes (Funcarte), através do seu Diretor de Eventos, o também macauense Castelo Casado, para animarem o carnaval de Natal, que busca revitalização, revigorando antigas tradições. Para se ter uma idéia, no percurso da Redinha, foi proibida a passagem de trios elétricos. Os macauenses tocaram na escolha do Rei e da Rainha do Carnaval, na Ribeira. Fizeram a abertura oficial, na Redinha e o encerramento, no Posto 7, em Ponta Negra. E agradaram! Os foliões presentes, entusiasmados, pediram seu retorno em 2010. O Frevo pode até não pipocar em Macau, mas não vai deixar de Pipocar ... Eu? Sexta-feira do Preto & Branco (ironia proposital) embarquei para a Cidade do Sol e fui brincar carnaval.


Gabriel Araújo Nunes


1 AMARRIBO – Associação dos Amigos de Ribeirão Bonito – Entidade do interior paulista que depois de conseguir a cassação do prefeito de sua cidade por improbidade administrativa, divulgou cartilha alertando os brasileiros sobre possíveis formas de administradores desviarem dinheiro público, entre as quais, utilizando-se de contratos superfaturados com bandas musicais.