segunda-feira, 27 de agosto de 2007

As Almas


A origem
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A gasta memória não guardou como surgiu o nome do bloco. Desrespeito ou zombaria pelos que partiram, católicas de carteirinha como éramos, jamais! Protesto, certamente. Eram tempos de preconceito, ditadura e as máscaras serviam para dar coragem a um grupo de moças que pensavam de uma forma bem diferente do convencional, numa pequena cidade do interior deste ‘Rio de Grande Sol’.
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Éramos 10, às vezes 14. Gracinha, Conça, Dineusa, Tica, Vilma Rejane,Vilma Pinheiro, Lúcia, Gracinha Paulo, Benigna, Regina, Naná, Estela, as fundadoras. Cacilda entrou na seqüência, depois de um sofrido ‘estágio’ na casa de Arlete. Tivemos algumas ‘visitantes’, Marisa Pinheiro, Cilene entre outras. Era um clube de luluzinhas, meninos não entravam na brincadeira. Tínhamos o apoio incondicional de Padre Penha. A brincadeira durou não mais que quatro inesquecíveis carnavais: 1970,1971, 1972, 1973.
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As reuniões aconteciam invariavelmente nas casas de Dona Iracema de Seu João Bento (a grande e talentosa figurinista do bloco) ou na mesa largada casa de Dona Luíza de Seu Romão, onde, no final da tarde, sempre rolava um jogo de palavras cruzadas regado a café com pão e manteiga. A Casa de Dona Lourdes Ferreira e de Quinha, era nosso porto seguro.
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Numa daquelas tardes, o nosso saudoso amigo Luiz Gomes, torcedor do bloco, compôs o hino oficial das almas.
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“Sou uma alma, vim do além
Não tenho corpo, cara e forma de ninguém
A minha tumba, sola terror
É fria e úmida com ausência do amor
Venham para cá,
É um convite todo especial
As almas do outro mundo
Balançam tudo neste carnaval”
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A população não entendia muito bem a ‘proposta’ do bloco e muitas vezes torcia a cara quando a gente passava. Padre Penha é quem nos salvava, sempre. A grande mentora da alegoria e fantasia era Gracinha Oliveira, assessorada pela artista Sila Albuquerque. Gracinha era tão apaixonada pelo bloco que acreditava que a gente podia ser campeã do carnaval. Pode? E no auge da farra, ela ordenava uma parada obrigatória na parte de trás da praça Monsenhor Honório para ‘ensaiar a coreografia’. Certa vez, Zé Oliveira convidou Padre Penha para fazer parte da comissão julgadora, foi a glória. Pelo menos dele ganhamos 10 em todos os quesitos. Naquele ano tiramos em 3º lugar. Ganhamos pro Equipicão que passou o resto da vida pagando o mico de ‘ter perdido até pras Almas’.
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Mas, também tínhamos grandes torcedoras que sempre abriam as portas de suas casas para os tradicionais assaltos de carnaval. Lembro agora de um assalto maravilhoso que acontecia todo ano na casa de Terezinha de Benero, grande amiga do bloco. Dona Maria, mãe de Francisca e Chico Parrudo, Vânia de Zé Tetéo, Seu Chico Seixas, Seu Manequim recebiam as almas com carinho. O assalto mais comportado era na casa de Seu Romão. Depois que a gente tinha tomado todas e mais algumas, dona Luíza inocentemente nos recebia com bolo e guaraná. Se alguma perguntava: ‘tem nem um ‘bate-bate (é o novo!) de tamarindo?”, ela respondia cheia de vigor: “Venha pra cá com safadeza, sem-vergonha!!!” O último assalto era na casa de Cacilda que morava no casarão da rua da frente. Aí o bicho pegava!!!
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Essa é a origem, se a memória ainda está em forma. As histórias são muitas.
..... e quem quiser que conte outra.