quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

TREZENTOS E SESSENTA E CINCO DIAS DE ESPERA


Precisei chegar aos cinquenta anos para descobrir que adoro o carnaval. Em meio à algazarra de pierrôs, baianas, ziriguiduns, telecotecos e que tais, me vi cantando, pulando, dançando. Verdade. Me descobri folião.Nunca tinha pulado carnaval até então, não com tanto afinco. E descobri isso, deve-se pular com afinco, com vontade. Só assim pude embarcar na alegria desesperada desses dias. Só assim entendi a felicidade de estar imerso num mar de duzentos mil pulantes ao redor dos, blocos nas avenida e ruas de Macau. Como diria caetano, pororonga, foi lindo, lindo. Divino e maravilhoso. Por quê? Porque todos estavam lá com um único objetivo. Cantar marchinhas. Dançar. Pular. Sorrir. compartilhar o momento. Nem uma Cara feia. velhos, jovens, crianças, bebês de colo sendo erguidos e abençoados por Padre Penha, que, juro, do alto da escadaria da Igreja onde estava, me mandou um beijo. Nada de tristeza, raiva, sofrimento. Uma dedicação irrestrita à alegria.Perdi a carteira, o celular? Relevo. Me encharcaram de cerveja? Agradeço. Pisaram no meu pé? Não leve a mal, é carnaval. Troquei sorrisos cúmplices com desconhecidos ao cantarmos as mesmas letras de velhas marchinhas. Abri cirandas e rodas no meio da multidão com Zorro, piratas e colombinas. Dei abraços afetuosos em foliões anônimos que me reconheciam de outros Dias e outros blocos. compartilhei água com sedentos. Dividi meios-fios com melindrosas e arlequins exaustos - por apenas um segundo, até alguém puxar uma letra, batucar uma lata de cerveja, e sairmos dançando novamente pelas ruas.Dedicar-se a cantar. Alalaô. Aurora. Mulata bossanova. Nêga do bole bole. Dedicar-se a dançar. Samba. Frevo. Maxixe. Dedicar-se a brincar. Guerra de serpentina. Guerra de espuma. Pulos, caretas, gritos, ivos.

Beber quando se tem sede. Descansar quando as pernas não mais agüentam. Sorrir para a fantasia inusitada de torre Eiffel, de mergulhador, de Abraham Lincoln. Agradeco os sorrisos à sua fantasia. como me disse um folião, que dançava trôpego pelas ruas da pequena cidade pacata, sozinho, às quatro da manhã, depois de ter pulado dia e noite incessantemente, “carnaval é isso: é pegar ou largar”.A sabedoria bêbada do folião desvendou o mistério de Tanta alegria. Dedicação. Dançar, pular, com vontade. Beber, com vontade. como dizia jorge ben no início de uma música (acho que so alquimistas), tem que dançar dançando. Sábio Paulinho de Macau. Vontade de dançar? Dance. Vontade de descansar? Descanse. Vontade de dormir? Durma. Obedecer a vontade. Como diz sponville, há prazer, há alegria, quando desejamos o que não falta. Por isso no carnaval respira-se alegria. Desejamos o que temos. Folia. Música. Algaravia.
Recorro ao filósofo folião da lapa. é pegar ou largar. Final, quem vive a vida com Tal afinco, qual um eterno carnaval? Quem consegue viver o agora com Tanta vontade? Viver desesperadamente? Comprovei nos Dias de folia que a felicidade está no presente. No agora. Prazer de se comer quando se tem fome. De desejar brincar, e se ver brincando. De dançar, dançando, diria são Jorge. Viver a vida, de fato. Fácil falar, difícil fazer. e, mesmo que conseguíssemos, por que a alegria não é a mesma? Onde estaria aquele êxtase coletivo? Seríamos o bloco do eu sozinho. O mundo estaria mais preocupado com suas velhas angústias, decepções e esperanças, deixando o agora de lado. E olharia de bem proximo para nós, loucos desesperados, que desejam apenas seguir atrás dos trios carnavalescos.O jeito é agüentar esses trezentos e sessenta e cinco Dias de espera. Final, assim Como sabemos que todo carnaval acaba, sobra a certeza reconfortante de que ano que vem tem mais.

E salve salve, filho de momo, balaústre do carnaval Macauense, quintessência da folia de rua, patrono eterno do blocos da nossa cidade.
Que bom que você está de Volta, senti saudades. Também passei por esses momentos que só na cidade maravilhosa de Macau a gente encontra.

Atenciosamente,
José Antonio